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Catástrofe ambiental e humanitária

06/03/2023

Professor da Universidade Federal do Pará (UFPA) e diretor da ANPUR (Gestão 2021-2023), Raul Ventura Neto é um dos autores do artigo “Catástrofe ambiental e humanitária“, publicado no site “A terra é Redonda“.

O texto, escrito em coautoria com Nilce Aravecchia e Eduardo Costa, utiliza o caso do Litoral Norte do Estado de São Paulo para refletir sobre a questão das catástrofes ambientais e seus efeitos sobre as populações mais pobres. Os autores recuperam alguns termos da literatura mais crítica dos anos 1970 para provocar o campo da arquitetura e do urbanismo no debate atual.

Catástrofe ambiental e humanitária

Por NILCE ARAVECCHIAEDUARDO COSTA & RAUL VENTURA NETO*

Não é por falta de pesquisa ou aviso que as catástrofes ambientais acontecem e vitimam populações pobres

“Em resumo, a pesquisa do urbano e das relações entre o Estado e o urbano requer uma pesquisa essencial sobre essas relações entre Estado e sociedade civil e sobre as contradições de interesses que formam agora dois blocos, a meu ver, que, além dos antagonismos do ponto de vista da produção social da riqueza, apresentam um antagonismo de como direcionar e utilizar o aparelho de Estado” (Francisco de Oliveira. O Estado e o urbano no Brasil, 1982).

A reação dos arquitetos e urbanistas frente à catástrofe decorrente das fortes chuvas no Litoral Norte do Estado de São Paulo demonstra bem a importância de reflexões elaboradas ao longo de décadas. Desde os anos 1970, com a explosão de crescimentos dos principais centros urbanos do Brasil, debate-se a espoliação urbana, a segregação socioespacial, além de tantos outros temas relacionados às desigualdades socioespaciais nas cidades brasileiras.[1]

Mais recentemente, estudos incorporaram os chamados “marcadores sociais da diferença”, para evidenciar como questões de gênero e raça interferem nos processos urbanos, para destinar os lugares mais precários às mulheres pobres e à população negra.[2] São incontáveis os textos, livros, pesquisas acadêmicas e grupos de pesquisa que se debruçam há décadas sobre esses temas. Os que se dedicaram a debater as contradições do campo do planejamento, em marcada oposição aos planos urbanos de perspectiva reformista, buscaram evidenciar seu caráter ideológico apoiados em grande parte na crítica marxista.

Mas fato é que, mesmo com a acentuada crítica no seio do próprio campo disciplinar, arquitetos e urbanistas tiveram grande influência no debate público, sobretudo a partir da Constituição de 1988. É verdade que nessa altura, já não mais sob a égide do modernismo, e dos grandes planos totalizantes, mas depositando grande expectativa nos movimentos sociais e em processos chamados “participativos”.

Instrumentos como o Estatuto das Cidades e o Plano Diretor – que passou a ser obrigatório para cidades de mais de 20 mil habitantes – ou as incontáveis leis complementares, tiveram cada vez mais a colaboração ou o envolvimento direto de estudiosos e profissionais dos temas urbanos e ambientais, e são prova irrefutável de sua incansável dedicação. Deve-se lembrar também da presença permanente de professores e pesquisadores em órgãos públicos de habitação e planejamento urbano. Estamos bem servidos e somos também referência mundial no debate.

Como já atestou a crítica desde os anos de 1970, não é, portanto, por falta de pesquisa ou aviso que as catástrofes ambientais acontecem e vitimam populações pobres. Mas é importante, sim, compreender por que, diante de uma tradição de estudos e instrumentos tão avançados, as tragédias acontecem cada vez com maior recorrência e gravidade? Como falar do papel decisivo dos profissionais de arquitetura e urbanismo, se enchentes – como as que assolam anualmente o Jardim Pantanal na cidade de São Paulo –, engarrafamentos – cada vez mais rotineiros inclusive em cidades do interior do país –, ou até incêndios – como o que fez colapsar o edifício Wilton Paes, no Largo do Paissandu em São Paulo –, deixaram de ser eventos esporádicos?

Leia o texto completo, clique aqui.